quinta-feira, outubro 20, 2016

IMAGINÁRiO #632

José de Matos-Cruz | 24 Outubro 2017 | Edição Kafre | Ano XIV – Semanal – Fundado em 2004

PRONTUÁRiO


CREPÚSCULOS

Agente da CIA treinado na violência e na destruição, Al Simmons trabalhou para o governo americano, em missões que provocariam o massacre de inocentes. Quando põe em causa tais proezas - já casado e feliz, esperando abandonar a funesta profissão - Simmons é vitima de traição e deslealdade dos superiores, representados no nefando chefe Jason Wynn, acabando por desaparecer num terrível holocausto. Até que as forças do submundo enviam a sua alma de volta à Terra, mas já não é o mesmo. Nem sequer uma pessoa. Transformou-se num monstro, com aspecto demoníaco e ávido de punição. Renascido, inexorável, sem princípios aparentes, Spawn tem de lutar contra o negro desígnio que lhe deu nova vida, de modo a evitar a chegada do Armagedão - pelo seu próprio regresso… Spawn foi concebido e ilustrado por Todd McFarlane, um prestigiado artista de banda desenhada em viragem de carreira, pelo início dos anos ’90, após ter reactivado o futuro de vigilantes clássicos, como Spider-Man dos Marvel Comics. Sob chancela Image Comics, Spawn trouxe consigo a materialização de um super-herói anacrónico e horripilante, cuja acção dilacera os limites do bem e do mal - um universo em transe, mutante, no qual se tornou este mundo, entre os sortilégios demoníacos e um paraíso idealizado. IMAG.3-38




CALENDÁRiO



03JUN-30SET2016 - No Estoril, Fundação Luís I apresenta no Espaço Memória dos Exílios, com o apoio da Sociedade Portuguesa de Autores/SPA, Desassossegos da Memória - exposição de Inácio Ludgero (fotografia) e Rosa Llórden (pintura). IMAG.629



1921-31JUL2016 - Mário Alberto Freire Moniz Pereira, aliás Professor Moniz Pereira, aliás Senhor Atletismo: Desportista português, atleta, praticante de várias modalidades, treinador, professor, autor musical e pianista - «Dêem-nos as melhores condições, que obteremos iguais resultados» (1975).



03AGO-17SET2016 - Câmara Municipal de Braga apresenta, em parceria com o Núcleo Fotográfico do Arquivo Municipal de Lisboa, a exposição de fotografia Braga de Artur Pastor (1922-1999), na Casa dos Crivos (A Alma e as Gentes) e no Museu da Imagem (Os Lugares da Memória).



1923-17AGO2016 - Arthur Hiller: Cineasta americano de origem canadense, director de televisão, presidente da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood (1993), realizador de Uma História de Amor / Love Story (1970) - «Contar histórias faz parte da condição humana. Os seus fundamentos são cerebrais, emocionais, colectivos, psicológicos. Um dos objectivos do narrador é insinuar no espírito do público algo que o sensibilize e, sobretudo, atraia a um nível que lhe seja irresistível» (2004). IMAG.117-294



18AGO-23SET2016 - Em Lisboa, Instituto Cultural Romeno apresenta O Jardim Com Anjos - exposição de escultura, cerâmica e pintura de Silvia Radu.



10SET2016 - Em Lisboa, e integrado no Festival Motel X, São Jorge exibe O Segredo das Pedras Vivas (2016) - filme de longa metragem realizado por António de Macedo, em remodelação da sua série televisiva O Altar dos Holocaustos (1992), produzida por Cinequanon; imagem restaurada a partir dos negativos originais, e novos som, música e montagem, a cargo de Kintop. IMAG.12-24-63-96-109-120-135-158-167-180-197-224-290-358-380-413-434-511-521-548



PARLATÓRiO

Sinto, por detrás do destino trágico do homem moderno, a natureza bela e eterna que não se interessa de maneira nenhuma pelas nossas tragédias efémeras. Somos sufocados pela angústia, não respiramos, sentimos, mais do que nunca, a necessidade de abrir uma pequena janela para ver, em um breve clarão, o céu, as estrelas, o mar, a primavera: mas, sobre tudo, a pequena janela fecha-se, e ficamos novamente perante os demónios das trevas que nos combatem. Lançar um olhar breve e violento sobre a natureza, entre dois gritos de luta e de angústia, torna-se cada vez mais, eu creio, uma fuga indispensável em direcção a um paraíso perdido. Mas esse olhar deve ser muito rápido, pois não temos mais tempo para nos determos com descrições detalhadas.

Nikos Kazantzákis (1957)

MEMÓRiA



1883-26OUT1957 - Nikos Kazantzákis: Ficcionista, poeta e pensador grego - «Atingir o homem do seu país, até chegar ao homem sem fronteiras, francês, grego ou chinês, o homem simplesmente, eis qual deve ser a ambição suprema do romancista. Acrescentemos algo importante: não podemos atingir o homem de todos os países, sem colher a sua essência no homem do nosso país». IMAG.10-69-152



1912-30OUT1997 - Samuel Michael Fuller, aliás Samuel Fuller: Cineasta e produtor americano - «Na guerra, só existe uma glória: sobreviver… O filme é um campo de batalha, com amor, ódio, violência, acção, morte… Numa palavra, emoção!». IMAG.127-206



VISTORiA



Um Grande Português – Origem do Conto do Vigário


Vivia há já não poucos anos, algures, num concelho do Ribatejo, um pequeno lavrador, e negociante de gado, chamado Manuel Peres Vigário.

Da sua qualidade, como diriam os psicólogos práticos, falará o bastante a circunstância que dá princípio a esta narrativa. Chegou uma vez ao pé dele certo fabricante ilegal de notas falsas, e disse-lhe: «Sr. Vigário, tenho aqui umas notazinhas de cem mil réis que me falta passar. O senhor quer? Largo-lhas por vinte mil réis cada uma.» «Deixa ver», disse o Vigário; e depois, reparando logo que eram imperfeitíssimas, rejeitou-as: «Para que quero eu isso?», disse; «isso nem a cegos se passa.» O outro, porém, insistiu; Vigário cedeu um pouco regateando; por fim fez-se negócio de vinte notas, a dez mil réis cada uma.

Sucedeu que dali a dias tinha o Vigário que pagar a uns irmãos negociantes de gado como ele a diferença de uma conta, no valor certo de um conto de réis. No primeiro dia da feira, em a qual se deveria efectuar o pagamento, estavam os dois irmãos jantando numa taberna escura da localidade, quando surgiu pela porta, cambaleando de bêbado, o Manuel Peres Vigário. Sentou-se à mesa deles, e pediu vinho. Daí a um tempo, depois de vária conversa, pouco inteligível da sua parte, lembrou que tinha que pagar-lhes. E, puxando da carteira, perguntou se importavam de receber tudo em notas de cinquenta mil réis. Eles disseram que não, e, como a carteira nesse momento se entreabrisse, o mais vigilante dos dois chamou, com um olhar rápido, a atenção do irmão para as notas, que se via que eram de cem. Houve então a troca de outro olhar.

O Manuel Peres, com lentidão, contou tremulamente vinte notas, que entregou. Um dos irmãos guardou-as logo, tendo-as visto contar, nem se perdeu em olhar mais para elas. O vigário continuou a conversa, e, várias vezes, pediu e bebeu mais vinho. Depois, por natural efeito da bebedeira progressiva, disse que queria ter um recibo. Não era uso, mas nenhum dos irmãos fez questão. Ditava ele o recibo, disse, pois queria as coisas todas certas. E ditou o recibo – um recibo de bêbedo, redundante e absurdo: de como em tal dia, a tais horas, na taberna de fulano, e «estando nós a jantar» (e por ali fora com toda a prolixidade frouxa do bêbedo…), tinham eles recebido de Manuel Peres Vigário, do lugar de qualquer coisa, em pagamento de não sei quê, a quantia de um conto de réis em notas de cinquenta mil réis. O recibo foi datado, foi selado, foi assinado. O Vigário meteu-o na carteira, demorou-se mais um pouco, bebeu ainda mais vinho, e daí a um tempo foi-se embora.

Quando, no próprio dia ou no outro, houve ocasião de se trocar a primeira nota, o que ia a recebê-la devolveu-a logo, por escarradamente falsa, e o mesmo fez à segunda e à terceira… E os irmãos, olhando então verdadeiramente para as notas, viram que nem a cegos se poderiam passar.

Queixaram-se à polícia, e foi chamado o Manuel Peres, que, ouvindo atónito o caso, ergueu as mãos ao céu em graças da bebedeira providencial que o havia colhido no dia do pagamento. Sem isso, disse, talvez, embora inocente, estivesse perdido.

Se não fosse ela, explicou, nem pediria recibo, nem com certeza o pediria como aquele que tinha, e apresentou, assinado pelos dois irmãos, e que provava bem que tinha feito o pagamento em notas de cinquenta mil réis. «E se eu tivesse pago em notas de cem», rematou o Vigário, «nem eu estava tão bêbedo que pagasse vinte, como estes senhores dizem que têm, nem muito menos eles, que são homens honrados, mas receberiam.» E, como era de justiça foi mandado em paz.

O caso, porém, não pôde ficar secreto; pouco a pouco se espalhou. E a história do «conto de réis do Manuel Vigário» passou, abreviada, para a imortalidade quotidiana, esquecida já da sua origem.

Os imperfeitíssimos imitadores, pessoais como políticos, do mestre ribatejano nunca chegaram, que eu saiba, a qualquer simulacro digno do estratagema exemplar. Por isso é com ternura que relembro o feito deste grande português, e me figuro, em devaneio, que, se há um céu para os hábeis, como constou que o havia para os bons, ali lhe não deve ter faltado o acolhimento dos próprios grandes mestres da Realidade – nem um leve brilho de olhos de Macchiavelli ou Guicciardini, nem um sorriso momentâneo de George Savile, Marquês de Halifax.

Fernando Pessoa

30OUT1926 - Sol (Lisboa)

BREVIÁRiO



Parceria A.M. Pereira edita As Aventuras de Fernando Pessoa [1888-1935] - Escritor Universal… de Miguel Moreira (texto e desenhos) e CatarinaVerdier (cor).
IMAG.26-28-64-82-130-131-157-182-187-196-207-211-236-264-323-326-330-333-343-347-376-382-384-385-395-399-403-404-417-426-433-450-460-467-491-507-509-524-540-551-556-561-576-593-596-604-605-612-613-617-622



Tinta da China edita Obra Completa de Alberto Caeiro de Fernando Pessoa (1888-1935); organização de Jerónimo Pizarro e Patrício Ferrari.



Sony Classical edita em CD, Utopia Triumphans por Huelgas Ensemble, sob a direcção de Paul van Nevel.



Tinta da China edita Histórias de Nova Iorque de Enric González; tradução de Raquel Mouta.
 

Sem comentários:

Enviar um comentário